Carlos Silva é uma entidade mística. É um mestre.


Conheci o poeta cantador Carlos Silva pela boca do grande compositor, Nininho de Uauá, em meados 2003. Foi um conhecimento gradativo e sensorial. Primeiro foi apresentado aos meus ouvidos e assim conheci seu timbre grave, firme, gutural. Um timbre com cheiro de terra e sabores que criavam uma escala que iam do melaço da cana ao gosto “travazo” do caju. Depois invadiu minha inteligência e me aculturou com suas letras. Dei para refletir sobre desterros, exílios e nordestinidades variadas. Muitos Brasis se desenharam em minha mente. Dei para pensar ao ritmo do Xote…Eram canções cheias de sentimento que espelhavam a grandeza de um talento brasileiro. Estava diante da obra de um artista popular e finalizei concluindo que Carlos Silva tinha alguma coisa de entidade mística, era um mestre… É um mestre!

Foi assim que Carlos Silva – cordelista-cantador-poeta matuto-artista politizado- pai de família-marido de Sandra Regina- entrou na minha vida. De lá pra cá a vida se incumbiu de dar as voltas necessárias para trazê-lo até São Mateus, cidade ícone cultural do norte capixaba!


Está aqui entre nós trazido pelo Centro Cultural Araçá e ciceroneado pelo, também poeta, Cesar Domiciano. Participou de um cortejo poético, cantou e declamou pelas ruas do centro de São Mateus e finalizou apresentando-se de casa cheia. Conheceu os jovens declamadores da cidade e esses mesmos jovens puderam apreciar a magnitude de um cantador agreste e raçudo.

Permanecerá ele na cidade até domingo e até lá muitos versos serão feitos, cantados e gravados por ouvidos mais atentos e sabe-se lá que efeitos causarão… A Arte é sempre transformadora.
Mas qual é a importância de Carlos Silva? O que tem demais o Projeto Araçá trazê-lo ou não? E daí que Cesar Domiciano está acompanhando ou se ele está se virando sozinho? O quê que tem se meninos de São Mateus, atendidos por projeto social, tem contato com cultura brasileira de qualidade? E daí se em plena quinta-feira há um evento que priorize a Cultura e traga mais vida à cidade? E daí para tudo isso?

Pois eu respondo, caro leitor!

Digo que numa cidade igual a nossa poder assistir a um artista como Carlos Silva é um privilégio. Mas trazê-lo e oferecê-lo, gratuitamente, ao público é um ato de generosidade e um investimento cultural que só um projeto como o Araçá, com 20 anos de atuação impoluta poderia fazer. Mostrar a meninos de bairros como Liberdade, Bom Sucesso, Aroeira, Vila Verde, Seac, Litorâneo e outros, um artista como esse é dar mais que entretenimento e dar uma referência de vida. É mostrar um caminho.

Mas um caminho seguro, o caminho da ética e da reflexão social. Mostrar outras tendências e estilos culturais é muito mais do que criticar o Rap e o Funk, é ser e estar EDUCADOR. A crítica pela crítica já deu! E completo; ver poesia viva andando pelas ruas da nossa cidade em plena quinta-feira, disputando e ganhando o espaço das tediosas novelas é maravilhoso! Falo ainda da generosidade de um artista indicar outro artista, mesmo que seja de áreas semelhantes, a Arte deveria nos unir. Não deveria haver competições.

Cesar Domiciano apresenta Carlos Silva ao Araçá- todos ganham. Isso é Cultura da Paz. Na verdade, não temos que querer ser melhores que ninguém, temos que ser melhores que nós mesmos!“É junto com os bãos que nóis fica mió”; diria a pintora Rosângela Politano…
São essas palavras que penso e declaro, amado leitor e, assim encerro essa coluna de Cultura parabenizando todos do Araçá pelos seus 20 anos, agradecendo a Cesar Domiciano pela indicação, feliz de estar viva e poder novamente rever meu amigo poeta matuto do sertão da Bahia; obrigada Carlos Silva pela visita e pela grandiosidade de sua obra.

Publicado em Blog Shila Joaquim - Cordel Umbilical